quinta-feira, dezembro 21, 2006
Natais
Lembro-me como foram muitos Natais. Começava no dia 24, pela manhã. Levantava-me cedo. Ia espreitar a primeira rabanada do dia, da quadra. Espreitava-a pelo sabor. Cheirava a canela, às vezes, cheirava muito a pão fresco, cozido no forno da minha avó. Não ajudara na feitura do pão, mas cavara alguns baldes de barro, que serviria para enclausurar o calor no forno enorme de tijolo refractário. Lembro-me também de ir a uma vizinha amiga buscar o fermento, que seria adicionado à farinha e água da amassadeira.

Depois, havia a aletria… em minha casa.

De tarde, aproveitava para dar uma volta sem fazer nada, a não ser procurar musgo nos penedos raros da aldeia, ou das aldeias à volta. E aparecia para o próximo passo: ir buscar couves, com troços bem verdes, resistentes à neve que caía nestes dias.

Na noite de consoada era a mesma confusão alegre de sempre: todos se juntavam à mesa. Uma mesa enorme com mais mesas e mais mesas ligadas em dominó. Com duas lareiras ao pé, se bem que a segunda lareira fora feita mais recentemente, aquecia-me durante horas.

Não apreciava bacalhau, nem as batatas, só as couves. Comia porque era assim, e hoje não me sentindo na obrigação do ritual, consinto-o porque sabe bem sê-lo como era.

Guardava barriga para os doces, porque para doces havia sempre barriga. Quando não havia, deixava para o dia seguinte.

Jogava às cartas, sem perceber os códigos e truques do jogo. Até às tantas. E deitava-me confiante que o Menino Jesus não se ia esquecer de mim. A pior prenda de todas as prendas foi um guarda-chuva preto. Foi a maior fraude de todos os Natais. Um guarda-chuva? Ainda por cima sabia qual o destino que aquele espanta-pingos iria ter… perdê-lo na escola.

No pequeno-almoço de dia 25, comia pão-de-ló e bebia leite. E a seguir ia à missa, e beijava o menino.

Cedo me apercebi que não era boa ideia estrear a roupa para o dia de Natal. Porque ou chovia, ou fazia a mesma figura de todas os outros meninos, e mais que meninos, que exibiam a veste e os sapatos novos naquele Santo Dia.

Ao almoço, era cabrito e carne assada. Detestava roupa velha. Não tinha piada trincar espinhas perdidas entre restos de comida da véspera. E mais doces, e mais doces, e chocolates, e o guarda-chuva era um pesadelo…

E à tarde, comia e comia… E à noite, finalmente apreciava o bacalhau, desta vez assado nas brasas de castanheiro. Sempre sabia melhor que cozido. E voltava outra vez para as cartas, só acabando por aprender que a batota não está certo. A piada das cartas está em jogar... e estar com a família, nestes dias do ano.
A todos, um Santo e Feliz Natal!
 
Lavrado por diesnox at quinta-feira, dezembro 21, 2006 | Permalink |


5 Comments:


At 2:55 da tarde, Anonymous Anónimo

Já não acho piada ao Natal há muito tempo. Aliás, nunca acreditei no Pai Natal o que é capaz de ter contribuído para a situação. E está cada vez pior. Esta coisa de nos deixarmos envelhecer... :/

De qualquer maneira (como leitora assídua do blog), agradeço e retribuo os votos. Boas festas diesnox, Ice-device, what's the point? e Thelma.

 

At 3:38 da tarde, Blogger Ice-device

o meu Natal era a festa que mais me agradava. Ainda é. Para mim começava realmente a 21 ou 22. fazer a árvore, ficar à lareira, não fazer nada.

A minha mãe sempre teve um espírito natalício e por isso apreciavamos todos bem a quadra.
Visitar familiares, comer filhós (sem açúcar para mim..), ver desenhos animados e filmes, e ir às compras. Ah... como sempre gostei de ir às compras...

Na consoada o bacalhau sempre foi de tradição. Depois, a partilha do serão, desejando saúde e felicidade.

As prendas vinham de manhã. Devo ter acreditado no pai Natal até aos 6 anos, mas depois, ao contrário do que podia pensar, a magia continuou.

Depois de adulto deixei de ir à missa no dia de Natal, mas continua a ser a minha fase do ano favorita. O frio e o nevoeiro de Moimenta, a lareira, o lazer, os votos constantes e a bondade das pessoas na rua. De repente parece que toda a gente entra num espírito diferente. De paz. De amizade. Para mim é impossível não sentir o Natal.

Boas festas a todos

 

At 4:08 da tarde, Anonymous Anónimo

Natal?! Só me lembro de enfeitar uma árvore gigante na sala da nhanhãe e fazer o presépio.. com o musgo (será que ainda usam musgo?). No dia 25 lá ia com os meus tios visitar os presépios das redondezas.... era magnífico. Ah! e adorava comer os chocolates que estavam pendurados na árvore... uma delícia... e sempre às escondidas!

Depois cresci e aprendi que o Natal só é magnífico quando existem crianças... e agora espero pelos meus nenéns... para voltar a descobrir o espírito de natal...

Para vocês... uma grande abraço e não se esqueçam de, pelo menos no Natal, dizerem às que ama que as amam!

E para os meus amores Ice, Diesnox e What´s the point ... AMO-VOS!

 

At 6:50 da tarde, Blogger Ice-device

EIA POIS ERA! OS CHOCOLATES PENDURADOS! NUNCA MAIS ME LEMBREI DELES! OBRIGADO THELMA!UM BEIJO ENORME

 

At 1:22 da tarde, Blogger xico

eu tenho uma doce e americana recordação das bengalas brancas e vermelhas com sabor a mentol penduradas na árvore de natal... este ano acho que volto a ter disso! um grande abraço e um feliz natal e um beijo e as saudades ao meus queridos diesnox, ice device e à recém incorporada de novo thelma (posso ser a tua louise?)... aos nossos fiéis visitantes e mesmo aos desconhecidos que nunca visitaram este blog... os votos de um feliz natal.