quinta-feira, fevereiro 17, 2011
Geração que pode mudar
Qualificação
Esta não é a geração mais qualificada de sempre da história portuguesa (pelo menos qualitativamente). Ter acesso à escola ou à universidade – e isso, é um avanço - não é sinónimo de boa preparação. O saber não advém apenas do contacto livresco. Há cursos que fornecem uma mão cheia de nada. O que se passou também com o Processo Bolonha acelerou um problema estrutural: licenciaturas com três anos equivalem a licenciaturas de cinco? Ou seja, aumentaram-se os índices de escolarização - de que é notável exemplo o Novas Oportunidades - para melhorar as estatísticas e de estatísticas, infelizmente, estão os centros de emprego cheios…

Ensino
O sistema de ensino está completamente afastado da realidade. Cada distrito vendeu a promessa de ter uma fábrica de enchidos, perdão, uma escola superior. E a promessa cumpriu-se: abriram-se escolas por todo o lado, criaram-se centenas de cursos, muitas vezes sequer sem o reconhecimento profissional e certificação que se lhes exigia. E agora, há um problema sério: o que fazer com tanto curso e tanta escola, numa altura em que a população escolar está a acompanhar o decréscimo da população em geral?

Mercado de trabalho
Não há empresas em proporção à massa licenciada, a iniciativa privada é escassa. Em teoria, só as organizações conseguem absorver as fornadas de licenciados que todos anos saem das faculdades. Por isso, cada qual terá um de dois caminhos: lança-se por conta e risco ou emigra. E não se pense que é o Estado ou a própria universidade que tem de garantir um posto de trabalho para o licenciado, pós-graduado, mestrado ou doutorado.

A geração
Não partilho nada da conclusão precipitada de que esta geração e as próximas vão ser mais pobres que a dos nossos pais. Esse cenário só ocorrerá se nada for feito: se o Estado continuar a financiar cursos sem saídas profissionais; se as universidades não arrumarem a sua própria casa e não fizerem uma selecção criteriosa dos recursos pedagógicos; se os empresários mantiverem essa mentalidade assente nos baixos salários e pouco na criatividade, estímulo e inovação. Os jovens não podem simplesmente desistir e esperar que as coisas aconteçam. É importante que cada um faça a sua análise sobre o futuro: o trabalho, não descurando o estudo, é a melhor arma para atingir o sucesso, o bem-estar. As pessoas esquecem-se facilmente, mas a geração dos nossos pais passou muitas dificuldades, porque Portugal já era um país atrasado, mal gerido e de mentalidade arcaica. Os jovens precisam de se convencer que só eles é que podem mudar o rumo das suas vidas, em vez de se preocuparem com as aparências (as roupas, os carros, as férias… dos outros). É ainda uma questão de prioridades: sermos felizes pode ser também uma escolha, não um propósito. Quando ouço frases como “matei a cabeça a estudar durante 3 anos”, percebo rapidamente por que é que os chineses e os indianos vão chegar ao topo. E se não quisermos ir mais longe, podemos ficar pela Alemanha, que é um exemplo europeu. O alemão é organizado (no método), pontual (cumpre ao minuto), despreocupado (não se enche de galões só porque tem um “canudo”), informal (o fato macaco é tão respeitável como o fato e gravata). E nós, vamos ser o povo da geração que ouve os Deolinda e chora porque "para ser escravo é preciso estudar", e não pensou no valor real dos 50 euros que deu pelo bilhete para assistir ao concerto?
 
Lavrado por diesnox at quinta-feira, fevereiro 17, 2011 | Permalink |


3 Comments:


At 5:02 da tarde, Anonymous Luis

Grande Marco,

sinceramente nunca concordei com o "Homem bom" apregoado pelo Rousseau. Cada qual define-se pelas suas escolhas. Estas podem ser condicionadas por factores externos, sociais, políticos, económicos, mas o facto é que a geração presente (da qual faço parte) acomoda as suas escolhas nestes factores, ao invés de os procurar alterar. Quando se generaliza a ideia de que é mais fácil exigir de terceiros (do Estado, da cunha, do vizinho, do amigo, etc.) que resolvam todos os nossos problemas, o resultado está à vista.

E o cenário vai piorar antes de melhorar. Basta olhar para as crianças que frequentam os ciclos escolares básicos e que se habituam, desde tenra idade, a trabalhar por objectivos - "tenho boas notas em troca de prendas e privilégios". Os jovens pais de hoje trocam a responsabilidade por uma esquema mais fácil: "raising CEOs".

 

At 9:26 da tarde, Anonymous Anónimo

Luís,
Há muita coisa que pode mudar. Há jovens que merecem uma oportunidade, mas o mundo é, frequentemente, injusto. Que bom seria que todos os que se esforçam atingissem os seus objectivos. Mas a sociedade em que vivemos é muito primária. Se não usas gravata, és um pé rapado... Se não és da linha, és um tipo fora do "inner circle";.... Todos os dias me bato contra esta maldita perversidade, contra estes "clichés" e práticas aburguesados, do quotidiano. Torço por todos que pugnam por um projecto de vida. Torço por todos os jovens que sonham. E acredito que é possível chegarem lá. Acredito mesmo.diesnox

 

At 3:09 da tarde, Anonymous Anónimo

Os Deolinda são interessantes. Mas se acham que a ideia é exigir um emprego estável e fácil não vamos lá. Tirando a geração anterior que realmente teve isso, nenhuma outra na história do país teve vida tão boa como a actual geração. Ponham-se a trabalhar e a lutar pelo futuro.

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