segunda-feira, março 26, 2007
Esta Europa que me entristece
oai
Numa visão puramente bíblica, o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus. Acredite-se ou não na mensagem das Sagradas Escrituras, a verdade é que, pelo menos, a criatura, tal como a conhecemos, procura herdar traços de identidade do criador.

Num raciocínio meramente sociológico, era suposto que as organizações mantivessem toda a raiz e laços com as pessoas, sociedades e grupos que encerram. Na sua génese, a Europa procurou respeitar essa ligação; com o tempo, porém, foi-se desligando dessa natureza.

Durante muito tempo, a ideia de um projecto de construção europeia partia de uma premissa simples: a unidade na diversidade. Uma imitação aliás gémea do melting pot americano, e que foi somando pequenos passos, sólidos e encorajadores.

A sensação dos povos e dos cidadãos europeus na actualidade é antes de um pessimismo a roçar a tragédia. Acresce à unidade na diversidade uma suspeita constante: a da descredibilidade. Mais que do défice democrático que paira nalgumas instituições europeias – a começar pela própria Comissão Europeia – o sentimento europeu é o de uma enorme desilusão, na forma como se vai avançando nesta Europa, hoje a 27. Desconfiança, desde logo, porque quem nos representa parece servir-se a si próprio, nos seus interesses e objectivos pessoais, acenando-nos com lenços de intenções perfeitas.

Na Declaração de Berlim, de 26 de Março, podemos ler: «Nós, os cidadãos da Europa, unimo-nos pelo melhor». E de facto o melhor que temos é: um impasse constitucional que bloqueia a consolidação do projecto europeu. Que outra coisa podiamos esperar do melhor que aquilo que temos? Barroso, Merkel e Blair ou Chirac - os dois, aliás, de partida – podíamos sonhar com mais?

Ainda nos lembramos da guerra no Iraque, onde pela primeira vez, no pós-II Guerra Mundial, a Europa meteu na gaveta o primado da defesa da paz e se juntou à voz dos que pensam que o Mundo se constrói pela via das armas. Memória frágil, com pouca digestão sobre o que se passou no 11 de Setembro ou no 11 de Março, para não recordar o que foi a desagregação jugoslava, bem dentro do coração da Europa.

A nós, cidadãos europeus, restam-nos dois caminhos possíveis: cruzarmos os braços como fazemos em muitas tarefas que não nos agradam e cairmos na fatalidade de que as coisas não têm saída; atacarmos, com todas as forças, este modo de ver e fazer a Europa.

Quem dirige a UE, só precisa de perceber uma coisa simples: é que se a Europa não for feita à imagem e semelhança dos povos Europeus, o seu destino será tão previsível como o foi, por exemplo, a Sociedade das Nações. Pensar que a paz é um dado adquirido e irreversível é tão leviano como considerar o Amor um sentimento eterno e certo.
 
Lavrado por diesnox at segunda-feira, março 26, 2007 | Permalink |


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