quinta-feira, janeiro 31, 2008
No raiar da República
Não tenho saudades da Monarquia, dos reis e das rainhas, dos palácios e das coroações. Nem sequer a vivi, o que tão-só sugere que saudades, se as houvesse, seriam de algo que nunca conheci. Pensar que estaríamos mais bem servidos se fossemos governados por um soberano de sangue azul é uma hipótese que não me convence. Não tivesse sido mal-tratada durante estes 98 anos, e a República seria realmente uma forma de governo ainda mais justa, mais humana, mais democrática. Pena que, para tragédia de todos nós, tenhamos destruído alguns dos seus valores. Não que professe o seu anti-clericalismo genético (hoje numa versão laico-fundamentalista), nem a ligação à maçonaria, mas admiro-a por valorizar o primado da Lei e o sentido da Justiça, de um modo que a generalidade dos monarcas não souberam ou não quiseram abraçar. Interiorizo ainda a ideia que o modelo parlamentar está a ficar obsoleto, desajeitado. O presidencialismo, que ataca a dispersão de poderes, seduz-me, desde logo na poupança de tempo e na concentração de recursos. Para quê um Presidente da República mais um Primeiro-Ministro, chefe do Governo, se bastava o primeiro órgão para conciliar o exercício da soberania com a direcção dos destino do país? Porquê tantos ministros e secretários de Estado se hoje, pela transversalidade dos problemas – e das suas soluções – a opção por uma paleta de ministros, com um aparelho administrativo constante, independente dos partidos vencedores dos escrutínios, poderia dar mais eficácia ao dever de satisfazer as necessidades do povo? Simbolicamente, a comemoração do 1 de Fevereiro de 1908 não me toca o espírito em concreto, mas antes convida à memória de longo prazo. Não interessa desculpar a História pela violência de um acontecimento que culminaria 2 anos depois, com o triunfo da República, a 5 de Outubro. Para os que postulam que o assassínio do rei D. Carlos I e do príncipe herdeiro, Luís Filipe, foi um acto bárbaro, lembremo-nos que durante séculos a Monarquia mal tratou os seus filhos, desperdiçou a riqueza ultramarina, adormeceu à sombra do atraso industrial, endividou-nos aos ingleses, ignorou o analfabetismo da população. Quando essa figura simpática – e não estou a ser irónico - que dá pelo nome de D. Duarte considera que «Portugal era mais avançado em 1900» do que é hoje, dá-me vontade de perguntar: mas, afinal, porque se fez a revolução do 5 Outubro? Não escamoteando muitos males e vícios de que a forma republicana padece, há inúmeras conquistas que a República nos trouxe. A mais genuína de todas: a possibilidade de escolha. Acima do despotismo iluminado de um sobre todos, a liberdade de decisão de cada um em particular. Resta também a lição: a República actual sofre de monarquite aguda. Basta comparar o que se passava nas décadas derradeiras da vigência da Monarquia com o que se passa hodiernamente. Não saibamos interpretar esses sinais e agir com sensatez e o cheiro a pólvora virá com a vontade popular, esgotados os cenários dos brandos costumes. Primeiro passo: a actualização para um regime presidencialista irá corrigir o desperdício semi-presidencial. Dará sem dúvida um impulso a um país cansado, conformado e verdadeiramente desigualitário.

(A 31 de Janeiro de 1891 dava-se a revolta republicana no Porto. Daqui vem o "Foi o 31!").
 
Lavrado por diesnox at quinta-feira, janeiro 31, 2008 | Permalink |


1 Comments:


At 1:18 da tarde, Blogger Ice-device

da monarquia só gosto da bandeira.